Blog

Frustrações e comportamentos disruptivos no Transtorno do Espectro Autista

18/08/2021

No Transtorno do Espectro Autista (TEA), frequentemente há dificuldades em lidar com frustrações devido a particularidades da condição, como inflexibilidade cognitiva, interesses restritos, dificuldades em regular os próprios sentimentos, déficits na linguagem receptiva e expressiva.

A criança/o adolescente pode se sentir frustrada/o quando tenta ganhar atenção, fugir ou se esquivar de demandas, ter acesso a reforçador; quando tem dificuldade de se autorregular em sobrecargas sensoriais etc. Dessa forma, comportamentos disruptivos podem emergir, já que existem déficits na comunicação de estados emocionais, necessidades, na autorregulação, entre outros.

Comportamentos disruptivos que estão sob controle de frustração podem ser descritos como respostas indesejadas emitidas como gritos, choros, se jogar no chão; arremessar/quebrar objetos; auto/heteroagressividade; comportamentos autolesivos (bater a cabeça, se morder) etc.

Devemos lembrar que comportamento é algo que se aprende e, dessa forma, pode ser modificado! Se tais comportamentos são emitidos e reforçados (a criança consegue o que quer e/ou ganha atenção), há grande probabilidade de haver repetição em situações semelhantes. Isso porque, se há reforço contingente a um comportamento, nosso cérebro “seleciona” tal comportamento como “útil”.

Levando em conta as particularidades do TEA e características de cada criança/adolescente, deverão ser pensadas estratégias no sentido de regular essas respostas às frustrações. O primeiro passo será sempre analisar todo o contexto que envolve: situações de frustração, comportamento e acesso a reforço, para, então, sabermos como não reforçar. A equipe multiprofissional que já acompanha a criança certamente poderá ajudar nessa análise e com orientações específicas.

Não existe uma “fórmula pronta”, mas, algumas dicas são:

– Antecipar, dar previsibilidade sobre possíveis situações nas quais a criança possa emitir esses comportamentos é importante. Assim como tentar o diálogo, explicar quantas vezes forem necessárias (utilizar-se de gestos, pistas visuais, linguagem adequada) e cumprir combinados;

-Nem sempre conseguiremos antecipar. E a orientação, em geral, é não reforçar o comportamento, ou seja, não ceder, mas, ao mesmo tempo, não entrar em conflito;

– No caso de disruptivos que se sabe que seguramente são mantidos por atenção, a estratégia pode ser não dar atenção a tais respostas e, ao cessar, direcionar para comportamentos mais adaptativos. Se riscos, proteger a criança ou conter, sem reforçar;

– No caso de comportamentos (por exemplo, o choro) com o objetivo de pedir algo, não reforçar –  o que não é o mesmo do que “ignorar a criança”, mas, sim, ensinar a forma correta de se pedir aquilo que ela deseja, seja apontando, seja dando dica verbal para que ela verbalize;

– Manter a demanda quando o comportamento acontecer por esquiva ou fuga da demanda;

– Usar de elogio social diante de comportamentos apropriados, como “Parabéns”, “Ótimo”, “Excelente”, “Isso mesmo”, sempre de forma entusiasmada.

A frustração é importante para o desenvolvimento de qualquer criança, que, aprenderá, aos poucos, a lidar com situações controversas, a ser tolerante e resiliente (capacidade de adaptar-se a mudanças, superar desafios).

Dra. Deborah Kerches

Dra. Deborah Kerches
Neuropediatria e Saúde Mental Infantojuvenil
Especialista em Transtorno do Espectro Autista (TEA)

Últimas publicações

Burnout e TEA: qual a relação?

Burnout e TEA: qual a relação?

Burnout é caracterizado por um estado de esgotamento caracterizado pela exaustão física e/ou mental de longo prazo relacionada ao trabalho. Embora Burnout seja, por definição, um termo referente ao cansaço extremo relacionado ao trabalho, tem sido muito utilizado no...

ler mais
Por que temos cada vez mais diagnósticos de TEA?

Por que temos cada vez mais diagnósticos de TEA?

Embora hoje num cenário de maior conscientização, ainda há muito preconceito quando o assunto é autismo... Nem sempre por falta de sensibilidade, mas, acredito, muito mais por falta de informação. Isso pode levar pessoas a dizerem erroneamente frases como, por...

ler mais
Shutdown no TEA: o que significa?

Shutdown no TEA: o que significa?

Shutdown é um termo por vezes utilizado para nomear um comportamento reacional a uma sobrecarga emocional e sensorial, a situações estressantes e/ou de ansiedade extrema. Caracteriza-se especialmente por respostas encobertas, ou seja, o indivíduo pouco se comporta de...

ler mais
Meltdown no TEA: o que significa?

Meltdown no TEA: o que significa?

Meltdown é chamado popularmente de “crise”. Trata-se de um episódio em que há perda temporária do controle emocional e dos impulsos de um indivíduo em reação a uma situação estressante, a uma frustração, a sobrecarga sensorial, a algo que leve a um “limite...

ler mais
Camuflagem social e impactos no TEA feminino

Camuflagem social e impactos no TEA feminino

Um fenômeno importante a ser abordado no contexto do espectro autista feminino é a camuflagem social. Camuflagem social é um termo que se refere a um conjunto de estratégias desenvolvidas pelo próprio indivíduo com TEA a fim de “camuflar”/“mascarar” comportamentos...

ler mais
Síndrome de Down (trissomia do 21) e TEA, qual a relação?

Síndrome de Down (trissomia do 21) e TEA, qual a relação?

Cerca de 18 a 39% dos indivíduos com Síndrome de Down (SD) apresentam como condição associada o Transtorno do Espectro Autista (TEA). Diagnosticar essa associação o mais precocemente possível é importante justamente para poder propiciar melhores oportunidades para que...

ler mais
A linguagem e desafios no diagnóstico de TEA feminino

A linguagem e desafios no diagnóstico de TEA feminino

O cérebro feminino apresenta maior densidade de neurônios em áreas relacionadas à linguagem. Isso afeta a apresentação sintomatológica do Transtorno do Espectro Autista (TEA) em meninas/mulheres e prevê, entre outros pontos, menores dificuldades para relações sociais,...

ler mais