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TEA feminino e a maior tendência a não externalizar desafios

17/03/2023

Já se reconhece que em meninas/mulheres com TEA há menor tendência a comportamentos externalizantes (agressividade, impulsividade, comportamentos disruptivos em geral) e maior uso de estratégias de camuflagem social (Hull et al., 2020).

A maior dificuldade em externalizar desafios, porém, implica meninas/mulheres com TEA mais suscetíveis a quadros de ansiedade, depressão, autoflagelação e distúrbios alimentares (Hull et al., 2020).

Essa tendência a não externalizar desafios e a condições comórbidas pode interferir no diagnóstico assertivo de TEA de diferentes maneiras, como por exemplo:

– Condições comórbidas podem contribuir para mascarar ou atenuar características autistas, de modo que meninas e mulheres com TEA recebam o diagnóstico apenas dessas condições (como ansiedade, depressão).

– Expressões comportamentais masculinas do TEA, relacionadas a maior externalização, tendem a chamar mais atenção do que as encontradas em meninas/mulheres, reforçando as dificuldades do diagnóstico de TEA no público feminino (Hiller et al., 2014).

Não por acaso muitas mulheres são diagnosticadas com TEA somente na adolescência ou vida adulta após terem recebido primeiramente o diagnóstico de outra comorbidade psiquiátrica, como transtorno de ansiedade, depressão, Transtorno de Estresse Pós Traumático (TEPT), ou ainda, de Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH), Transtorno de Personalidade Borderline (TPB), entre outras possibilidades.

O fato de as mulheres normalmente receberem seu diagnóstico de autismo mais tardiamente quando comparadas aos homens (Begeer et al., 2013; Kirkovski et . al 2013; Rutherford et al., 2016 ) evidencia as dificuldades com esse tipo de diagnóstico.

Na prática clínica, observamos com frequência casos de adolescentes, jovens ou adultas com TEA, ainda sem diagnóstico, que acabam pesquisando sobre suas dificuldades e “se encontram” nas características do espectro autista.

São, geralmente, pessoas que cresceram se achando “diferentes”, tentando se adequar. Quando acabam por ter o diagnóstico, grande parte delas diz sentir “um alívio” ao entender e compreender “quem são”, ter uma resposta para grande parte de seus desafios e poder fazer algo a respeito disso.

Dra. Deborah Kerches

Dra. Deborah Kerches
Neuropediatria e Saúde Mental Infantojuvenil
Especialista em Transtorno do Espectro Autista (TEA)

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