Quando nascemos, nosso cérebro não “está pronto”. Através da exposição às inúmeras experiências vamos construindo novas conexões e modificando a estrutura e funcionamento do nosso cérebro, ganhando novos repertórios e habilidades ao longo da vida.
No centro dessa arquitetura totalmente dinâmica, está um conjunto de habilidades complexas chamadas de funções executivas. Essas começam a se desenvolver na infância, porém, estarão totalmente desenvolvidas somente na vida adulta (por volta de 24-25 anos), e representam elementos fundamentais para o desempenho de uma pessoa ao longo de toda sua vida. Preveem o controle de comportamentos, cognição e emoções. São um conjunto de habilidades que permitem a uma pessoa direcionar seu comportamento a metas, inibir respostas impulsivas, mudar hábitos, tomar decisões, avaliar riscos e planejar o futuro (Bosa & Teixeira, 2017).
Diz respeito a um indivíduo ser apto a lidar com os outros, com as múltiplas demandas e com as inúmeras distrações.
Funções executivas são processos cognitivos complexos necessários para a organização e adaptação do comportamento a um ambiente em constante mudança (Jurado e Rosselli, 2007). Incluem habilidades como:
– Inibição (ou controle inibitório) – responsável por controlar pensamentos e comportamentos; permite ao indivíduo inibir ou controlar respostas impulsivas, respostas a estímulos distratores, interromper respostas que estejam em curso;
– Planejamento – uma operação complexa em que uma sequência de ações é monitorada, avaliada e atualizada, tornando possível ao indivíduo atingir o objetivo proposto;
– Flexibilidade cognitiva – habilidade de alternar pensamentos e/ou ações, de acordo com mudanças de ambiente ou contexto, permitindo ao indivíduo adaptar-se a novas, variáveis e inesperadas situações;
– Fluência verbal – consiste na capacidade de emitir comportamentos verbais e não-verbais, seguindo regras pré-estabelecidas (explícitas ou implícitas);
– Memória de trabalho (ou operacional) – permite ao indivíduo manipular um delimitado volume de informações necessárias para a execução de ações presentes.
TEA e Disfunções executivas
Disfunções executivas têm sido descritas com frequência no TEA e em outras condições do neurodesenvolvimento.
Em uma revisão sistemática de estudos publicados entre 2001 e 2011, Czermainski et al. (2014) encontraram uma tendência de disfunções executivas em crianças e adolescentes com TEA envolvendo os componentes da inibição, do planejamento, da flexibilidade mental, da fluência verbal e da memória de trabalho.
A disfunção executiva justifica diversas características presentes no TEA, como:
– déficits atencionais;
– dificuldades no planejamento de tarefas;
– os comportamentos repetitivos;
– os interesses restritos;
– ausência ou escassez de brincadeira simbólica;
– dificuldades em encontrar caminhos diferentes para a resolução de problemas imediatos e em lidar com o novo;
– dificuldades em compreender as intenções de outra pessoa e se relacionar de uma forma geral.
Comprometimentos em especial no controle inibitório preveem dificuldades em monitorar ações, resultando em comportamentos mais impulsivos e de hiperatividade, bem como em comportamentos-problema.
Apesar das fortes evidências de disfunções executivas no TEA, ainda não há consenso na literatura sobre quais componentes executivos estão mais prejudicados. Considerando-se que o TEA é uma condição muito heterogênea, as inúmeras possibilidades sintomatológicas justificam a variabilidade de desempenho em termos de funcionamento executivo.
De toda forma, não há dúvidas sobre a importância de se estimular as funções executivas no TEA por meio de intervenções sempre individualizadas.
Referências:
Bosa, C. A., & Teixeira, M. C. T. V. (2017). Autismo: Avaliação psicológica e neuropsicológica (1 ed). São Paulo: Hogrefe.
CZERMAINSKI, F. R. et al. Executive functions in children and adolescents with autism spectrum disorder. Paidéia, Ribeirão Preto, v. 24, n. 57, p. 85-94, abr. 2014.
Jurado, M.B. and Rosselli, M. (2007) The Elusive Nature of Executive Functions: A Review of Our Current Understanding. Neuropsychology Review, 17, 213-233.